quarta-feira, 4 de abril de 2012

O Percurso do Primeiro Romance

“ O percurso do Primeiro Romance” , assim se chama o livro de Jean Michel Barrault, que decidi ler porque o título me induziu em erro, serviu, entre outras coisas, para trazer ao consciente uma noção que já existia no meu subconsciente. Sempre tive uma enorme relutância em ler o que os livreiros expõem em primeiro plano, os livros da moda, aqueles que estão na boca de todo o mundo, que são mencionados por jornais e revistas, e cheguei a pensar que era pura mania minha.

A minha desconfiança relativamente à publicidade é tal, que sempre me afastei dos livros que ocupam demasiado espaço em lugares de destaque de demasiados espaços comerciais (só fui abrindo excepção para autores cuja qualidade reconheço porque conheço a sua obra). Daí este meu gosto pela troca de impressões: o maior estímulo que alguma vez tive para efectuar qualquer das minhas leituras, foi sempre a opinião ou o entusiasmo de alguém em cujo gosto confio mais do que no colorido de capas e escaparates.

Como dizia, este livro, cuja estrutura e estilo são, para mim, completamente novos, agradou-me bastante pela sua originalidade e pelo realismo do seu conteúdo, que numa linguagem por vezes muito elegante, outras muito precisa, quase sempre de uma ironia finíssima, expõe, inteligentemente, de forma romanceada, a hipocrisia em que está , actualmente, mergulhado o mundo da literatura; o mundo dos prémios e honrarias; o modo como são forjados alguns best-sellers; as circunstâncias em que alguns escritores são guindados à categoria de estrelas, ao passo que outros são absolutamente ignorados (não tendo esta eleição por base a qualidade dos seus escritos); o modo como funcionam os meandros da crítica literária (os clientelismos, as capelinhas mais ou menos influentes), os lobbies das editoras; o modo despudorado como os livreiros nos conduzem as leituras “ obrigando-nos” a consumir determinadas obras…Enfim , também a arte a sofrer do mal dos tempos, deste mundo economicista e interesseiro em que vivemos e o risco que o artista corre de se tornar um mercenário se se deixar “ seduzir pela palha dos estábulos dourados do mundo” e se não for “ afastando com jeito ou força, todos os obstáculos que se levantam( por exemplo , o [seu] sentido de apetência do cómodo” como tão bem disse Agostinho da Silva.

Mesmo considerando que é um livro muito situado no tempo, que será provavelmente esquecido para sempre dentro de alguns anos, penso que contém , mesmo assim , algumas questões intemporais (o romance  fala de si próprio, o escritor  fala do escritor, a própria linguagem  fala da linguagem, o criador  fala da criação). Gostei imenso!

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