quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

As Minhas Leituras

João Vaz de Carvalho

Teoria da Inteligência criadora

Se o negócio proporcionado aos editores e livreiros que, muito amavelmente, colocam muitos dos seus livros à nossa disposição para que os mostremos e desejavelmente vendamos, numa qualquer feira do livro, de uma qualquer pequena escola, não for suficientemente rentável, esta será, ainda assim, de uma enorme utilidade que, por vezes, só se manifestará a longo prazo, quer para os leitores, quer para os próprios livreiros...
Numa das já numerosas feiras do livro que a nossa escola organizou,“tropecei” num livro desconhecido de um autor também lamentavelmente desconhecido na altura, cujo título me fascinou. Estimulou de tal forma a minha curiosidade de leitora, de educadora e de psicóloga de horas vagas que o comprei. Nele, descobri verdades daquelas que calam fundo e que contribuem para a recuperação da nossa inocência essencial, daquela parte de nós que se perdeu nos tempos do consumo desenfreado de bens materiais e degradáveis e que não recuperámos mais, por nos faltarem momentos de silêncio e de encontro connosco próprios.
Neste livro, que, não só os educadores como todos os apreciadores da criação deveriam ler, encontrei a forma que procuro sem cessar para ideias até aqui inexprimíveis, como por exemplo, as contidas nas citações que se seguem:
“ A carência radical do ser humano, a sua inevitável condição de prematuramente nascido, exige a elaboração de uma nova noção de pessoa em que os outros homens têm uma função catalizadora.”
“Apenas [a consciência] nos relaciona com a existência. Por isso não podemos abandoná-la.”
“ A realidade em bruto não é habitável: é preciso dar-lhe significados, segmentá-la, dividi-la em áreas e consruir passagens e relações para ir de uma a outra área”
“ A vistosa cúpula da criação livre tem os seus alicerces na invisível argamassa dos automatismos.”
“ A nossa agilidade radica-se em rotinas estáveis. Os bailarinos podem converter-se em organismos habitados pelo pensamento da música, porque previamente desenvolveram em si próprios um corpo expressivo no ginásio”
MARINA, José António,Teoria da Inteligência Criadora

A Ideia de Europa #1

Para um leitor mais preguiçoso, mas ainda assim exigente, um livro pequenino de leitura obrigatória.
À laia de estímulo:
“ A cultura mais não é do que um convite, um convite ao cultivo da nobreza de espírito.”
“ fazer dinheiro e inundar as nossas vidas de bens materiais cada vez mais trivializados é uma paixão profundamente vulgar e inane.”
“ Não é a censura politica que mata: é o despotismo do mercado de massas e as recompensas do estrelato comercializado”
“ Somos bípedes capazes de sadismo indizível, ferocidade territorial, ganância, vulgaridade e todo o tipo de torpeza(...) no entanto este mamífero desgraçado e perigoso gerou três ocupações, vícios ou jogos de uma dignidade completamente transcendente. São eles a música, a matemática e o pensamento especulativo ( no qual incluo a poesia cuja melhor definição será música do pensamento)”

STEINER, George, A Ideia de Europa

Reflexões críticas

O Pensador

Os Direitos Inalienáveis do Leitor

Pela leitura da sua famosa declaração dos “Direitos Inalienáveis do Leitor” poderíamos ser levados a pensar que Daniel Pennac, no seu bem conhecido livro “ Como um Romance”, faz a apologia do não leitor, já que “ o direito de não ler” ocupa, nada mais nada menos, que o primeiro lugar naquela declaração.
É, no entanto, espantosa a forma como nos conduz, astuciosamente, num tom aparentemente coloquial mas elegante, e de uma eloquência disfarçada de uma enorme simplicidade, pelo universo de muitas das obras de arte literária mais marcantes que alguma vez se escreveram. É, também, admirável a eficácia da estratégia que utilizou para nos espicaçar a curiosidade. Para estimular, em nós, uma vontade irreprimível de as ler, ainda que nos diga claramente que o nosso direito mais inalienável é “ o direito de não ler”.

“ Os Direitos Inalienáveis do Leitor”

1. O Direito de Não Ler

2. O Direito de Saltar Páginas

3. O Direito de Não Acabar Um Livro

4. O Direito de Reler

5. O Direito de Ler Não Importa o Quê

6. O Direito de Amar os “Heróis” dos Romances

7. O Direito de Ler Não Importa Onde

8. O Direito de Saltar de Livro em Livro

9. O Direito de ler em Voz Alta

10. O Direito de Não Falar do Que se Leu

PENNAC, Daniel, Como um Romance
Textos de opinião

Os Nossos Diamantes

Partindo do étimo da palavra” educar” Agostinho da Silva explicava que tudo aquilo que a criança precisa de aprender já está dentro dela própria. Vergílio Ferreira disse, inclusivamente, que “ ninguém nos ensina nada. Só se consegue aprender o que nos não interessa. Porque o que é do nosso fundo destino, somo-lo: se alguém no-lo ensinou não demos conta disso”. A mim, agrada-me a imagem do bloco de granito disforme, de dentro do qual sai a fascinante escultura pela mão do artista.
Cabe-nos, pois, a tarefa difícil de, sub-repticiamente, fazer emergir, na íntegra, o que já se consegue antever; a tarefa artística de fazer com que, em vez de um boneco patético e risível, de dentro destes potenciais diamantes, saia uma escultura perfeita e a obra de arte se manifeste.
Quem tem, entre mãos, as “pérolas” que venceram a componente de “ Leitura Expressiva” do “Concurso Literário” tem também uma enorme responsabilidade: a de não deixar que se percam na “ vida imediata, quotidiana [nesta] selva de caminhos, de veredas, de confusa vegetação”, a de não deixar apagar-se aquela chama genial que me fez arrepiar de comoção!

Parabéns aos participantes!

Textos de opinião 2

Os Meus Escritores Preferidos

Miguel Torga
caricatura de Santiagu

Miguel Torga

"O meu perfil é duro como o perfil do mundo


Quem adivinha nele a graça da poesia?

Pedra talhada a pico e sofrimento,

É um muro hostil à volta do pomar.

Lá dentro há frutos, há frescura, há quanto

Faz um poema doce e desejado;

Mas quem passa na rua

Nem sequer sonha que do outro lado

A paisagem da vida continua."

Mia Couto


Para quem ainda não conhece Mia Couto- o poeta que conta histórias- e a sua originalíssima obra, quem sabe, esta possa servir-lhe de estímulo:

A VELHA E A ARANHA

Deu-se em época onde o tempo nunca chegou. Está-se escrevendo, ainda por mostrar a redigida verdade. O tudo que foi, será que aconteceu? Começo na velha, sua enrugada caligrafia. Oculta de face, ela entretinha seus silêncios numa casinha tão pequena, tão mínima que se ouviam as paredes roçarem, umas de encontro às outras. O antigamente ali se arrumava. A poeira, madrugadora, competia com o cacimbo. A mulher só morava em seu assento, sem desperdiçar nem um gesto. Em ocasiões poucas, ela sacudia as moscas que lhe cobiçavam as feridas das pernas. Sentada, imovente, a mulher presenciava-se sonhar. Naquela inteira solidão, ela via seu filho regressando. Ele se dera às tropas, serviço de tiros.
- Esta noite chega Antoninho. Vem todo de farda, sacudu.
Para receber António ela aprontava o vestido mais a jeito de ser roupa. Azul-azulinho. O vestido saía da caixa para compor sua fantasia. Depois, em triste suspiro, a roupa da ilusão voltava aos guardos.
- Depressa-te Antoninho, a minha vida está-te à espera.
Mas era mais as esperas do que as horas. E o cansaço era sua única caricia. Ela adormecia-se, um leve sorriso meninando-lhe o rosto. E assim por nenhum diante. Desconhece-se a data, talvez nem tenha havido, mas num dos seus olhares demorados, a velha encontrou um brilho cintilando num canto do tecto. Era uma teia de aranha. Ali onde apenas o escuro fazia esquina, havia agora a alma de uma luz, flor em fundo de cinza. A velha levantou-se para mais olhar o achado. Não era a curiosidade que lhe puxava o movimento. Assustava-lhe a sua transparência demasiada. E, de logo, lhe surgiu a pergunta que luz tecera aquele bordado? Não podia ser obra de bicho. Não. Aquilo era trabalho para ser feito por espirito, criaturamente. A teia podia só ser um sinal, uma prova de promessa. Decidiu-se então a velha surpreender o autor da maravilha. A partir dessa tarde, seus olhos emboscaram o tempo, no degrau de cada minuto. Esquecida do sono e do sustento, não houve nunca sentinela mais atenta. Até que, certa vez, , se escutou um rumor quase arrependido, desses feitos para ser ouvido apenas pelos bichos caçadores. Por uma breve fresta se injanelava uma aranha. Era de um verde pequenino, quase singelo. Com vagaroso gesto a velha foi tirando o vestido do caixote. Usava os mais lentos gestos, fosse para o bicho não levar susto.
- Qualquer uma coisa vai acontecer!
Era suspeita que ela bem sabia. Confirmou-se quando as duas, mulher e aranha, se olharam de frente. E se entregaram em fundo entendimento, trocando muda conversa de mães. A velha sentiu o bicho pedia-lhe que ficasse quieta, tão quieta que talvez qualquer coisa pudesse acontecer. Então ela se fez exacta, intranseunte. As moscas, no sobrevoo das feridas, estranharam nem serem sacudidas. Foi quando passos de bota lhe entraram na escuta. Antoninho! A velha esmerava-se na sua imobilidade para que o regresso se completasse, fosse o avesso de um nascer. E lhe vieram as dores, iguais, as mesmas com que ele se havia arrancado da sua carne. Encontraram a velha em estado de retrato, ao dispor da poeira. Em todo o seu redor, envolvente, uma espessa teia. Era como um cacimbo, a memória de uma fumaragem. E a seu lado, sem que ninguém vislumbrasse entendimento, estava um par de botas negras, lustradas, sem gota de poeira.

Entrevistas a Escritores e outros Artistas

D. Quixote
de Pablo Picasso

Ricardo Araújo Pereira

CL - Existem tantas nuances de riso. O riso de cócegas, o riso de gozo, o riso de cumplicidade, o riso irónico, o riso de alegria, o riso de quem tenta espantar tristezas. Aquilo que o Ricardo faz hoje, no âmbito do Gato Fedorento, que tipo de riso pretende provocar?
RAP - Se calhar sou pouco sofisticado, mas satisfaço-me com qualquer um. Não posso ser esquisito, porque o riso não abunda. Há até quem diga que já não existe. Foi agora editado em Portugal um livro («História do Riso e do Escárnio» de Georges Minois, Teorema) cujo autor defende que o riso morreu. E o Eça escreveu que o riso tinha morrido durante a sua infância, altura em que julga ter ouvido a última gargalhada genuína, e ele nasceu em 1845. Isto pode significar que o riso, depois de ter morrido há 150 anos, morreu agora outra vez. O que, curiosamente, dá vontade de rir.
CL – E o que provoca o riso dos outros em si?
RAP - Tenho dificuldade em nomear uma sensação melhor do que a de fazer rir os outros. O riso, se não é felicidade, imita muito bem.
CL – Sente que criou uma personagem “Ricardo”?
RAP - Não creio, mas a imprensa faz um esforço persistente para criar essa personagem. No aniversário do «Jornal de Letras» mandei para os meus antigos camaradas de redacção um cesto com flores, chocolates e champanhe. Um jornal descobriu que o tinha feito e isso foi o suficiente para escrever que eu sou um grande apreciador de champanhe. De então para cá, é raro o artigo que não mencione a minha especial, embora inexistente, predilecção por champanhe. Metade do que se diz sobre mim na imprensa é mentira, e a outra metade é desinteressante.
CL - Apesar do sucesso, parece manter uma certa sobriedade. Como é possível manter-se sóbrio com a embriaguez de se ser reconhecido na rua, ser-se citado, perceber que frases suas passaram a fazer parte das conversas das pessoas, das piadas entre amigos?
RAP - Tudo o que referiu, sendo embora lisonjeiro, não é particularmente inebriante. Além de que eu saio pouco de casa. E cá em casa ninguém me dá importância nenhuma.
CL - O Ricardo escreve mas também compõe personagens enquanto actor.
RAP - O essencial do que fazemos, no Gato Fedorento, é a escrita. Já éramos guionistas antes disto, e essa ainda é a nossa profissão. O facto de interpretarmos os textos que escrevemos sempre foi, e continua a ser, um acidente. Depois de ter escrito para Herman José e Maria Rueff, por exemplo, só se não tivesse vergonha é que eu diria de mim próprio que sou um actor. Portanto, somos apenas veículos que transmitem, o melhor que podem, o texto ao público.
CL - Permita-nos bisbilhotar um pouco as suas leituras.
RAP - Posso enumerar aqui meia dúzia de autores, mas estarei a deixar de fora outros igualmente importantes. Não será um exercício rigoroso, mas vamos a isso. Estrangeiros: Cervantes, Shakespeare, Molière, Sterne, Flaubert, Twain, Tchekhov, Lodge. Portugueses: Fernão Lopes, Camões, Vieira, Camilo, Eça, Mário de Carvalho.
Ufa!
CL – Tendo aceite o convite de entrevista para Círculo de Amigos termino com a inevitável pergunta: que livro do Círculo sugere aos nossos sócios?
RAP - Poesia 2001/2005 de Vasco Graça Moura. Ele é um grande poeta (ver, por exemplo, o testamento de vgm), um grande tradutor (ver o tigre de william blake), e tem o sentido de humor dos grandes escritores (ver o poema que se chama o decassílabo).


Infelizmente perdi de vista a fonte de onde extraí esta interessante entrevista. Se alguém quiser fazer o favor de ma fornecer agradeço muito, antecipadamente

Aforismos e Citações



Lencinhos de Viana

Sobre a educação

"O Ensino devia ser de modo a que o que é dado fosse recebido como uma prenda valiosa e não como uma tarefa árdua. "

Albert Einstein

Outono

Dezembro

  • Dezembro com Junho ao desafio, traz Janeiro frio.
  • Dezembro frio, calor no estilo.
  • Em Dezembro, treme de frio cada membro.
  • Nem em Agosto caminhar, nem em Dezembro marear.
  • Nuvens em Setembro: chuva em Novembro e neve em Dezembro.Dezembro molhado, Janeiro geado.
  • Natal na eira, Páscoa na borralheira.
  • Dos Santos ao Natal é Inverno natural.
  • Pelo Natal, neve no monte, água na ponte.
  • Os dias de Natal são saltos de pardal.
  • Depois que o Menino nasceu tudo cresceu.

Palavras em Vias de Extinção


Termos da Tradição Oral Local


Bisalhices

Bisalheiro

Felga

Basulaque/verde

Rubina

Forfolha

Escalforrado

Emborcar

Badalhoco

Lambona

Gadelha

Gadanha

Os Meus Trabalhos de Projecto


Os Meus Poemas

O Beijo
E é a força sem fim de duas bocas,

De duas bocas que se juntam, loucas!

Alexandre O'Neill

Hino Eco-Escola

HINO “ECO-ESCOLAS”


Refazer, recuperar, reconstruir

Retroceder, reconhecer: Não destruir!

Reformular, reestruturar e reunir

P’ra cooperar.



Exausta, a terra reclama.

Secam fontes

Morrem rios…

Do solo, outrora fecundo

(rasgado o ventre do mundo)

Esvai-se toda a energia

De um planeta moribundo!



E das cores e formas várias

Que a natureza oferecia,

Hoje restam poucas, raras,

E uma enorme nostalgia!



Repensa o uso que dás

À tua Mãe Natureza!

Recusa os objectos fúteis!

Recusa tudo o que traz

Mais tristeza, mais tristeza…

Reduz consumos inúteis

Reutiliza!

Recicla!

Não acabes com a Beleza!!

A propósito de um Provérbio Africano

“ Para educar uma criança é preciso a tribo inteira”

Há não muitos anos atrás, a educação das crianças estava a cargo da família, da igreja e da aldeia. Ao professor cabia a simples tarefa de instruir, sem grandes preocupações com a diferença, impondo um estilo próprio a qualquer dos grupos a quem se dirigisse, e deixando ao critério dos ouvintes a estratégia de aquisição do conhecimento Este debitava conhecimentos, por vezes de forma monótona, sem resistência nem interrupções, (nesse tempo, só frequentavam a escola os filhos de elites, e a sua instrução era levada a sério pois perpetuava-os no poder). O professor pouco ou nada se actualizava ao longo da vida (nesse tempo a ciência ainda não duplicava cada dois anos), e podia dedicar grande parte do seu tempo a enriquecer a sua cultura geral, se assim o desejasse. O trabalho burocrático ainda cabia integralmente aos funcionários administrativos e o horário de permanência na escola era de 22 horas semanais. Nesse tempo, o professor, que, ou era homem e, frequentemente, tinha em casa a esposa a tratar da casa e da família, ou, sendo mulher, tinha em casa uma empregada, a tempo inteiro, que providenciava todo o trabalho doméstico (dez por cento do seu vencimento era suficiente para lhe pagar: ainda não se falava em igualdade e justiça social), era o fiel depositário do saber, tinha prestígio, tempo, e uma vida relativamente facilitada por todos. Era de facto “um senhor”!
Hoje, que a “tribo” se desmembrou, porque cada um dos seus membros se encontra, algures, a trabalhar sem descanso, sob a ameaça de um qualquer sistema de avaliação, mais ou menos arbitrário, espera-se do professor que instrua, de forma individualizada, cada um dos seus duzentos alunos, que provêm dos mais variados estratos sociais (pertencendo a maioria deles à primeira geração escolarizada); que domine as mais modernas pedagogias e recorra a estratégias de diferenciação, enquanto, simultaneamente, se lhe exige que consiga uma taxa de sucesso de 100%. Espera-se que substitua as famílias na educação e na providência do afecto de que carecem muitíssimos dos seus alunos, e que, simultaneamente, garanta a custódia dos potenciais marginais. Espera-se que substitua o psicólogo e resolva os casos problemáticos e que, simultaneamente, nesta escola ideal, inclusiva, (e sobrelotada! E sem meios!) domine as mais modernas técnicas de abordagem dos casos com deficiência sem que, para o efeito, o tenham preparado. Espera-se que a escola, pela mão dos professores, acabe com o abandono escolar, com os problemas sociais, com a marginalidade, com a criminalidade, desmontando dia após dia, hora após hora, o processo de deseducação de que são alvo os filhos dos indigentes, dos dependentes, dos incompetentes, dos marginais e criminosos, que também frequentam a escola. Culpabilizam-no pela indisciplina, pela agressividade e pela violência, apesar de se saber hoje que “ uma diferença grande entre os valores centrais de dois grupos pode levar ao antagonismo directo por falta de um sentimento de humanidade partilhada”. Espera-se que compita, diariamente, com os meios de comunicação, com as novas tecnologias e que, para o efeito, as domine, e as use nas suas aulas, para as quais também deverá criar e desenvolver materiais diferentes, arrojados, interessantes, capazes de fazer esquecer os adorados telemóveis, os generalizados jogos de computador, as “chatrooms” e toda a panóplia de “imprescindíveis” bens materiais, tão queridos à recentemente instalada cultura hedonista. O imediatismo vigente (tudo é descartável!), quase impossibilita a acumulação de conhecimentos, indispensável na cultura escolar que temos. Desenvolver o potencial intelectual, sem acumulação de conhecimentos, é uma tarefa, obviamente, impossível. Sabe-se, aliás ,que “ a capacidade para adiar a recompensa contribui poderosamente para o potencial intelectual (…) e é talvez a essência da auto-regulação emocional”...
Enquanto se debate com todas estas dificuldades, trabalhando nas condições mais adversas que se podem imaginar, com mudanças a ocorrer ao ritmo da vertigem, vê, o professor, alargado para 26 horas o seu tempo de permanência na escola, quadruplicadas as suas tarefas, vê-se inundado de tarefas burocráticas, e com o seu vencimento diminuído para níveis aproximados dos das suas potenciais empregadas domésticas, impossibilitado, assim, de pagar a quem lhe tome conta dos filhos, enquanto, que (pasme-se!) se lhe dificulta, de forma revoltante, o seu acompanhamento (mesmo na doença!). Proporcionam-lhe condições de trabalho dignas de escravos, e exigem-lhe um perfil e uma produção de resultados dignos de executivo de multinacional.
Num tempo em que se sabe que “ nunca se exigiu tanto do indivíduo como agora (…) obrigado a inventar a sua vida sem manual de instruções”, ao ritmo alucinante da mudança, e sabendo-se como se sabe que “ para ser um bom educador, como para ser um bom médico, é preciso ser fundamentalmente um optimista”, surpreendem-se, os responsáveis, com a reacção, nunca vista, da “corporação” mais desunida, e agora, mais desesperada, que o mundo alguma vez conheceu!